O portal da Ufes dá início nesta terça-feira, 5, à série de reportagens que apresentará a trajetória pessoal e profissional de alguns professores negros da Ufes. Eles compõem o universo de 419 docentes autodeclarados negros (pretos e pardos) das diversas áreas do conhecimento, distribuídos nos quatro campi da Instituição.
O projeto foi idealizado pelo secretário de Ações Afirmativas e Diversidade da Universidade, Gustavo Forde, como parte das celebrações em torno dos 70 anos da Instituição e em comemoração ao Dia da Consciência Negra (20 de novembro). O secretário é o primeiro personagem desta série especial.
Licenciado em Matemática, Forde começou a lecionar no início dos anos 1990 em escolas públicas da Grande Vitória e, já nessa época, participou de ações com foco nos estudos afro-brasileiros na educação. Desde 2016 é professor do campus de Goiabeiras, em Vitória, lotado no Departamento de Teorias de Ensino e Práticas Educacionais do Centro de Educação (DTEPE/CE). De acordo com a Pró-Reitoria de Gestão de Pessoas (Progep), dos 133 docentes do CE, 45 se autodeclaram negros, sendo 23 professoras e 12 professores.
Forde destaca que sua trajetória profissional sempre foi marcada pelo compromisso no desenvolvimento de uma educação baseada nos valores e nas contribuições negro-africanas. “Devo este meu posicionamento ao Movimento Negro do Espírito Santo, pois foi lá que recebi as primeiras formações sobre a necessidade de introduzir os estudos africanos e afro-brasileiros nas diversas áreas de conhecimento da educação”, destaca ele, que é um dos responsáveis pela disciplina Educação das Relações Étnico-Raciais (Erer), ofertada para todos os cursos de graduação (licenciatura).
Pesquisas
Após concluir os cursos de mestrado e doutorado em Educação, o professor passou a direcionar sua prática ao campo da história da Matemática, da África e do negro no Brasil. No campo da Matemática, as pesquisas de Forde buscam examinar e registrar descobertas de ascendência africana e tecer reflexões que problematizem a presença africana na prática historiográfica. Seus estudos já localizaram registros de matrizes negro-africanas nas áreas de aritmética, geometria e álgebra. Em outro trabalho, ele tratou da constituição histórica do movimento negro do Espírito Santo e das constribuições e transformações que esse movimento tem produzido na educação escolar, especialmente nos campos do currículo, dos materiais de ensino e da formação de professores.
Com 35 anos de militância negra, Forde atua como pesquisador no Núcleo de Estudos Afro-brasileiros (Neab) e no Núcleo Capixaba de História da Educação (Nucaphe), ambos da Ufes.
Obstáculos
Forde avalia que há distinção entre ser um professor universitário e ser um professor universitário negro por causa da maneira como as instituições brasileiras foram concebidas: “Elas são atravessadas por uma concepção eurocêntrica, racialista e colonialista, havendo ainda uma grande supremacia branca e da branquitude nos modos de ‘pensar’, ‘fazer’ e ‘gerir’ as políticas de ensino, pesquisa, extensão e gestão. Essa realidade reverbera um conjunto de obstáculos institucionais aos docentes negros”.
Para ele, essa situação não é específica de uma instituição, sendo agravada pelo fato de que a produção acadêmica de professores negros (que, segundo Forde, rompe com a tradição eurocêntica) está alicerçada em referenciais teóricos e metodológicos distintos daqueles que são reconhecidos e valorizados majoritariamente nas universidades.
Gestão
Em 2017, Forde passou a fazer parte da gestão administrativa da Ufes, atuando como diretor de Direitos Humanos e Cidadania. Em 2019, assumiu a Pró-Reitoria de Políticas Afirmativas e Assistência Estudantil e, este ano, participou da criação e assumiu a Secretaria de Ações Afirmativas e Diversidade (Saad). Dentre suas várias ações ao longo desse período na gestão, ele contribuiu para a criação da Diretoria de Ações Afirmativas e Diversidade (Daad) e atuou na composição da primeira Comissão de Heteroidentificação para verificação de candidatos pretos e pardos.
“Seguimos promovendo processos educativos comprometidos com o movimento de consciência negra e de negritude. No âmbito da Ufes, essas ações e trabalhos repercutem na luta por ‘outro’ projeto de universidade, que, para além de pública, gratuita e de qualidade, também seja pluriétnica, socialmente referenciada e não eurocêntrica”, conclui.