Ufes lidera primeira pesquisa nacional para traçar um retrato da saúde mental dos brasileiros

03/12/2025 - 16:56  •  Atualizado 03/12/2025 17:21
Texto: Adriana Damasceno     Edição: Thereza Marinho
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Foto de uma jovem triste, sentada no chão, em casa

Um trabalho inédito que visa entender quantas pessoas no Brasil têm transtornos mentais, o que pode influenciar esse adoecimento, como elas usam os serviços de saúde e quais são os impactos disso na vida delas e da sociedade: esse é o objetivo da primeira Pesquisa Nacional de Saúde Mental (PNSM-Brasil), um estudo de base populacional que terá início em janeiro, em domicílios de todas as regiões do país, utilizando entrevistas estruturadas aplicadas presencialmente por entrevistadores treinados. 

O estudo, que deve durar cerca de cinco meses, é coordenado pela professora do Departamento de Saúde Coletiva e do Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva Maria Carmen Viana. Segundo ela, que é médica psiquiatra, a ideia da pesquisa surgiu a partir da observação de que o país carece de dados nacionais atualizados e abrangentes sobre saúde mental, informações necessárias para subsidiar políticas públicas.

Por meio da contratação de uma empresa de pesquisa especializada, a equipe da PNSM-Brasil entrevistará pelo menos dez mil pessoas com idade acima de 18 anos, residentes em 16.667 domicílios, conforme definição do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Não são elegíveis para o estudo as populações indígenas, quilombolas, pessoas privadas de liberdade ou institucionalizadas, pessoas em situação de rua, indivíduos com deficiências cognitivas graves, e quem não fala português.

Com duração média de 90 minutos, a entrevista será aplicada a um único morador de cada residência e avaliará diversos aspectos da saúde mental, como humor, ansiedade, uso de substâncias, experiências traumáticas, suicidalidade (pensamentos, sentimentos ou comportamentos suicidas), doenças crônicas e uso de serviços de saúde. “Além disso, também serão avaliados os dados demográficos e socioeconômicos por meio de um instrumento padronizado internacionalmente que permite a identificação rigorosa de diferentes transtornos e suas características clínicas”, explica Viana.

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Montagem com fotos dos membros da equipe que vai coordenar a pesquisa
Equipe de pesquisadores que vai atuar na pesquisa. Ao centro, a professora Maria Carmen Viana

A professora destaca que a amostra será selecionada por técnicas probabilísticas complexas, para garantir a representatividade da população brasileira. Todos os entrevistadores foram treinados diretamente por Viana e sua equipe de pesquisadores, certificados pelo Centro de Treinamento da Universidade de Michigan, nos Estados Unidos. “Para garantir a qualidade, todas as entrevistas são checadas, gravadas e pelo menos 30% dos participantes serão recontatados para confirmação das informações. Os dados são enviados em tempo real para acompanhamento e passam por processos sucessivos de consistência antes das análises finais”, explica.

Resultados esperados

As informações coletadas permitirão estimar a prevalência de transtornos mentais na população, tanto ao longo da vida quanto nos últimos 12 meses e 30 dias, além de investigar a gravidade, o curso clínico, a idade de início, comorbidades, fatores sociais e condições associadas. Entre os objetivos específicos da PNSM-Brasil estão: identificar determinantes sociais de sofrimento psíquico, como desigualdade, violência e exposição a experiências adversas na infância; avaliar o uso de serviços de saúde, lacunas assistenciais e motivos para abandono de tratamento; e estimar custos e consequências (individuais e para a sociedade), como incapacitação e perda de produtividade. Os resultados esperados incluem a consolidação da pesquisa como instrumento permanente de vigilância em saúde mental, alinhado às metas nacionais e internacionais de enfrentamento das doenças crônicas e dos agravos não transmissíveis.

Todos os participantes respondem voluntariamente, com garantia de sigilo e proteção conforme a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). “Questões sensíveis, como risco de suicídio e ocorrência de violência sexual na vida adulta e/ou infância, são autorrespondidas de modo reservado para evitar desconforto, e qualquer participante que demonstre sofrimento ou risco é orientado a procurar serviços de saúde mental locais”, destaca a coordenadora.

O relatório final da PNSM tem previsão de ser divulgado até o final de 2026. Os benefícios esperados a partir das análises dos dados coletados incluem aprimoramento da informação em saúde mental no país, fortalecimento da rede assistencial e subsídio direto às políticas públicas voltadas à prevenção, promoção e cuidado em saúde mental, contribuindo para a redução da carga de doenças e para a melhoria da qualidade de vida da população brasileira.

O estudo é financiado pela Secretaria de Vigilância em Saúde e Ambiente do Ministério da Saúde (SVSA/MS), por meio de um Termo de Execução Descentralizada (TED), e integrará o consórcio World Mental Health Surveys da Organização Mundial da Saúde e das universidades de Harvard e Michigan. “Mais de 30 países participam desse consórcio. Isso garante a internacionalização de ações e pesquisas da Ufes e facilita a colaboração e a mobilidade acadêmica”, conclui Viana.

Foto: Freepik e equipe PNSM-Brasil

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