“A Ciência tem muito a contribuir na construção de uma sociedade sustentável”, afirma Paulo Artaxo

20/02/2025 - 14:33  •  Atualizado 20/02/2025 16:28
Texto: Vivian Costa - Jornal da Ciência/SBPC
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Foto do cientista Paulo Artaxo falando no púlpito

“A emergência climática exige uma mudança urgente no modelo socioeconômico, de forma a garantir uma sociedade verdadeiramente sustentável. Para atingir esse objetivo, é necessário fortalecer o equilíbrio entre políticas públicas, governança eficiente e financiamento adequado”, alertou Paulo Artaxo, professor do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP) e vice-presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), em sua conferência que teve como tema Os Desafios da Construção de um Planeta Sustentável. A atividade foi apresentada durante a sessão de abertura da Reunião Regional da SBPC no Espírito Santo, realizada nesta quarta-feira, 19, no Teatro Universitário.

Artaxo enfatizou que, se os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) não forem efetivamente adotados, teremos um sistema socioeconômico insustentável. Ele afirmou que a crise climática é uma urgência que necessita de soluções profundas e imediatas.

O físico, um dos principais especialistas brasileiros em mudanças climáticas, disse que as ações humanas têm aquecido o planeta a uma taxa sem precedentes, por pelo menos cem mil anos, e não é mais uma questão de reduzir emissões, mas de como transformar nossa sociedade. “O Brasil hoje é o sétimo maior emissor do planeta, o quarto em emissões per capita e o sexto em emissões históricas desde 1950. Ou seja, nós temos, sim, uma grande responsabilidade na questão das mudanças climáticas”.

Artaxo destacou que o ser humano já ultrapassou mais de 60% dos limites planetários, em áreas como mudança climática, integridade da biosfera, uso da terra (com destaque para o desmatamento de florestas tropicais), escassez de água e alterações nos ciclos biogeoquímicos. “Estamos ultrapassando o que poderia ser chamado de limites seguros para o desenvolvimento socioeconômico do nosso planeta”, alertou.

Exploração desenfreada

O cientista ressaltou que a exploração desenfreada dos recursos naturais e a destruição de ecossistemas tanto no Brasil quanto no mundo têm ampliado as desigualdades socioeconômicas, um reflexo claro do atual modelo de desenvolvimento insustentável. “É urgente debater sobre como podemos construir uma sociedade sustentável, não só do ponto de vista econômico, ambiental e climático, mas também social”, afirmou. Para o vice-presidente da SBPC, o sistema socioeconômico vigente é insustentável, até mesmo no curto prazo.

Para reforçar sua posição de que as questões ambientais são um problema de todos, Artaxo mencionou um estudo do Fórum Econômico Mundial (WEF), divulgado em janeiro deste ano, que aponta o avanço das mudanças climáticas, junto aos conflitos armados e tensões econômicas globais, como as principais ameaças para o ano de 2025. “Esse levantamento foi feito por economistas preocupados com o impacto econômico. Das dez maiores ameaças para os próximos dez anos, quatro estão diretamente relacionadas à questão ambiental e climática”, explicou, destacando que a crise climática não é mais um tema restrito a ambientalistas, ONGs ou cientistas, mas um risco que afeta diretamente a estabilidade do sistema econômico global.

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Foto de Paulo Artaxo no púlpito e, ao lado, a projeção de um slide

Artaxo também lembrou que há mais de 50 anos a ciência vem alertando os governantes sobre os riscos associados às emissões de gases de efeito estufa. No entanto, apesar do Acordo de Paris, as emissões continuam a crescer. “Hoje, cerca de 57,8 bilhões de toneladas de gases de efeito estufa são lançadas à atmosfera todos os anos. A produção e uso de combustíveis fósseis é responsável por mais de 85% das emissões. Do ponto de vista climático, sem acabar com a exploração e uso de combustíveis fósseis, nosso planeta está com seu futuro comprometido”, disse.

Eventos extremos

A intensificação dos eventos climáticos extremos, como as ondas de calor recentes no Sudeste e Sul do Brasil, tornou-se a face mais visível das mudanças climáticas. Chuvas intensas também se intensificaram nos últimos anos. O cientista também mencionou que a população mais pobre e vulnerável está sendo a mais afetada pelas mudanças climáticas. Os impactos na saúde da população já estão sendo muito fortes. Em relação às projeções de aumento da temperatura média global em diferentes cenários elaborados pelo IPCC, Artaxo contou que, se mantivermos a trajetória atual, o planeta estará a caminho de um aumento médio de temperatura na ordem de 3.1 graus Celsius. Isso implica que em algumas regiões brasileiras, podemos ter aumentos de temperatura de 4 a 4.5 graus Celsius.

Por fim, o físico destacou que a questão energética é central na discussão sobre mudanças climáticas. Ele afirmou que, embora alternativas como energia solar e eólica estejam em ascensão, o mundo ainda depende fortemente de combustíveis fósseis, como óleo, carvão e gás natural, que são responsáveis por mais de 80% das emissões de gases de efeito estufa. “É fundamental que nossa sociedade evite um colapso do sistema climático global, e a Ciência é ferramenta fundamental nesta tarefa, junto com um novo sistema de governança global”, concluiu.

Veja aqui a sessão de abertura da Reunião Regional e a conferência na íntegra.

Fotos: Jardel Rodrigues/SBPC

 

 

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