Ufes discute permanência estudantil e saúde mental: “Bandeira que precisamos assumir”

23/05/2023 - 16:47  •  Atualizado 24/05/2023 18:30
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Caminhos para a construção de uma experiência positiva para os estudantes na universidade, por meio de processos colaborativos que envolvam toda a comunidade acadêmica, foram apontados no Cine Metrópolis, na manhã desta terça-feira, 23, no evento Construindo ações de permanência estudantil na Ufes. 

Promovido pela Pró-Reitoria de Graduação (Prograd) e pela Universidade Promotora de Saúde (UPS), o encontro contou com a apresentação do programa Permanecer e Concluir e com a palestra Desempenho acadêmico e saúde mental, proferida pelo professor da Universidade Federal da Bahia (UFBA) Adriano Peixoto (foto).

Com transmissão ao vivo pelo canal da Ufes no YouTube, o evento integrou as comemorações do aniversário de 69 anos da Ufes que, ao longo do mês de maio, tem oferecido uma programação com atividades culturais e formativas abertas ao público.

Dando início às apresentações, o vice-reitor da Ufes, Roney Pignaton, convocou a comunidade universitária a pensar e participar de ações que visam a permanência e a conclusão dos cursos de graduação pelos estudantes. Ele, que já foi coordenador de curso, afirmou que o papel mais importante nesse processo é dos professores.

“No diálogo com os estudantes, eles traziam suas aflições, como a distância da família e a inserção num processo de ensino que não conseguiam acompanhar. Eles sentiam muita falta de um acolhimento mais próximo dos professores. Isso não está normatizado, mas precisamos compreender que é importante”, disse. "Queremos que nossos estudantes entrem na Universidade e saiam com o diploma", completou Pignaton (foto abaixo). 

Após a fala do vice-reitor, a pró-reitora de Graduação, Cláudia Gontijo, apresentou as diretrizes e a metodologia do programa Permanecer e Concluir, desenvolvido em 2022. A iniciativa reúne uma série de ações que visam ampliar a política de acesso, permanência e conclusão pelos graduandos, prevenindo a evasão e o trancamento de matrículas. Construído a partir da análise de indicadores acadêmicos e em diálogo com coordenações e colegiados de cursos, direções dos Centros de Ensino e docentes, o Permanecer e Concluir não veio “para ser apenas mais um programa”.

“Os desafios institucionais que enfrentamos precisam da colaboração de todos. Ou nos organizamos colaborativamente, compartilhando responsabilidade e agindo coletivamente, ou não conseguiremos vencer os desafios que as instituições de ensino vivenciam hoje, principalmente da conclusão dos cursos”, disse.

Para a pró-reitora (foto), a taxa mais preocupante é a de evasão. Segundo ela, 46% dos estudantes no Brasil não concluem seus cursos de graduação. “Não podemos ficar inertes diante desse dado”, afirma. “A bandeira da permanência é uma bandeira que temos que assumir com muita força na Universidade”.

Na Ufes, segundo dados do Painel Informativo da Pró-Reitoria de Planejamento e Desenvolvimento Institucional (Proplan), em 2020 foi registrada uma taxa de evasão de 11,6%.

Saúde mental

Mediada pela diretora de Apoio Acadêmico da Prograd, Margarete de Moraes, a palestra Desempenho acadêmico e saúde mental apresentou diversos dados colhidos na UFBA sobre transtornos mentais verificados em estudantes de graduação. A pesquisa foi realizada em coautoria com a pesquisadora Rebeca de Barros, no Programa de Pós-Graduação de Psicologia da UFBA, em 2019.

Segundo Peixoto, a prevalência de transtornos mentais em graduandos se deve, em parte, aos novos papéis e expectativas inerentes à passagem da adolescência para a vida adulta. Afastamento da família, pressão por desempenho, incerteza sobre o futuro profissional – esse conjunto de mudanças, para o professor, torna os estudantes propensos a distúrbios mentais. “E a universidade não exatamente se preparou para essa nova realidade”, afirmou.

O estudo considerou o “senso de comunidade” como pressuposto para a permanência do estudante no ambiente universitário. Isto é, se o graduando mantém laços frágeis com a comunidade, ele não tem motivo para permanecer integrado a ela. Assim, os pesquisadores examinaram os vínculos de natureza acadêmica – do estudante com professores e funcionários – e com colegas e atividades extracurriculares.

Resultados

Entre os resultados, chamaram a atenção porcentagens de estudantes que ingressaram na universidade com diagnóstico de algum transtorno mental (23,8%); que procuraram ajuda psicológica ou psiquiátrica (44,1%); e que consideram sua saúde mental afetada muito ou totalmente pela universidade (56,4%). Agregados, os dados de transtornos mentais comuns (depressão ou ansiedade), sem diagnóstico, chegaram a 71,5%, enquanto os de estudantes que tiveram pensamentos suicidas chegaram a 21,6%.

“Um quinto dos nossos estudantes, antes da pandemia, disseram que no último mês pensaram em acabar com a própria vida. Se isso não é motivo suficiente para ficarmos preocupados, não sei o que podemos dizer mais dessa situação na universidade”, disse Peixoto.

O professor apresentou, ainda, dados de transtornos mentais por cursos de graduação, que revelaram que 91,3% dos estudantes do curso de Design manifestaram transtornos mentais comuns. “A experiência mostra que, quando tratamos de questões acadêmicas, os dados brutos muitas vezes escondem a realidade. A unidade de análise deve ser o curso, tanto para evasão quanto para saúde mental ou qualquer tema desses”, explicou, citando também a prevalência em mulheres (79%) diante dos homens (59,4%).

Outros grupos analisados foram cotistas e não cotistas, sendo que os cotistas chegaram a 34,6% quando perguntados sobre níveis severos ou extremamente severos de depressão, ansiedade ou estresse, enquanto não cotistas atingiram 29,6%. “Nos níveis mais severos, na gravidade dos sintomas, cotistas e não cotistas se diferenciam. Eles deveriam ser o nosso foco, mulheres e cotistas”.

Caminhos

No fim da apresentação, Peixoto sugeriu alguns caminhos para as universidades auxiliarem no sofrimento psíquico dos estudantes. Para ele, é necessário que haja orientação e formação para os professores; atendimento psicológico de forma paliativa, não como única solução; estímulo à formação de grupos e comunidades entre estudantes e demais membros do ambiente universitário; e melhor organização dos espaços nos campi, de modo a se tornarem “amigáveis” à convivência.

“Construímos prédios, sala de aula, mas nos preocupamos pouco com os espaços de convivência. A maioria dos alunos chega na universidade e vai direto para a sala de aula, vive pouco a universidade. A universidade precisa se converter num espaço agradável e que permita o encontro”, afirmou.

 

Texto: Leandro Reis
Fotos e edição: Thereza Marinho