Ufes forma a primeira turma do Curso de Licenciatura Intercultural Indígena

19/06/2023 - 18:32  •  Atualizado 20/06/2023 19:09
Compartilhe

Em um momento histórico para a Ufes e para os povos originários do Espírito Santo, aconteceu na última sexta-feira, 16, a cerimônia de colação de grau da primeira turma do Curso de Licenciatura Intercultural Indígena do Centro de Ciências Humanas e Naturais (CCHN) da Universidade. O curso bilingue, voltado para indígenas Tupinikim e Guarani, teve início em julho de 2015, por meio do Programa de Apoio à Formação Superior e Licenciaturas Interculturais Indígenas (Prolind), do Ministério da Educação, em parceria com a Ufes.

Nessa primeira turma foram graduados 51 estudantes, sendo 28 na habilitação Arte, Linguagem e Comunicação; dez em Ciências da Natureza e Matemática e 13 em Ciências Sociais e Humanidades. Vestidos com as tradicionais becas, os formandos valorizaram a cultura indígena com seus cocares, colares, pintura de rosto e, nas mãos, maracas que soavam a cada momento de comemoração.

O objetivo do curso foi promover qualificação em nível universitário para educadores de escolas indígenas de Ensino Fundamental e Médio, e as aulas foram ministradas na Base Oceanográfica da Universidade em Aracruz.

A solenidade reuniu professores e servidores da Ufes, convidados e parentes das cinco tribos Tupinikim e Guarani de origem dos estudantes: Comboios, Caieras Velha, Pau Brasil, Boa Esperança, Três Palmeiras e Irajá.

Marco histórico

O primeiro cacique de Caieiras Velha, José Sezenando (Yppraett, em Tupinikim), lembrou da mobilização das lideranças dos povos originários, ainda em 1979, em busca do direito à educação para as crianças indígenas. “A gente meditava sobre o que fazer para garantir o direito para as nossas crianças, para a nossa juventude que hoje está aqui”, recordou, destacando que os jovens sofriam preconceito na escola tradicional.

Representando a turma, a estudante Alzenira Marques ressaltou a importância do momento para as comunidades indígenas. "Somos um marco histórico na educação escolar indígena; não somos apenas professores, somos educadores, somos lideranças. Nosso trabalho não consiste apenas naquele período em sala de aula, e sim em todos os momentos de nossa vida. Somos exemplos para as crianças, para a comunidade, para nosso povo. Somos responsáveis pelo fortalecimento da identidade étnica, pela manutenção da cultura, pela valorização do conhecimento dos nossos anciãos e, principalmente, por registrar a nossa história”.

Conhecimento ancestral

Paulo Tupinikim (foto), coordenador geral da Articulação dos Povos Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (Apoinme), lembrou das articulações para a “abertura das portas da Universidade aos indígenas, pois as cotas não eram suficientes para atender toda a demanda da população indígena”. E afirmou: “Fico feliz em saber que esse projeto não vai acabar. Vamos lutar para abrir as portas para outros cursos, como Medicina e Direito”.

Ele destacou: “Nós já temos o conhecimento dos nossos anciãos; já temos a força da nossa cultura, temos o conhecimento ancestral, mas precisamos do conhecimento científico para podermos fazer a luta por igual com aqueles que estão a todo momento querendo tirar os nossos direitos”, disse, lembrando da reivindicação contra o marco temporal para a demarcação das terras indígenas que tramita no Congresso Nacional.

Outros saberes

A diretora do CCHN, Edinete Maria Rosa, que presidiu a solenidade de colação de grau, afirmou: “Esse momento marca um novo tempo na nossa Universidade, e não iremos mais largar a mão de vocês. Nós queremos essa Universidade mais indígena, mais inclusiva. Agradecemos por vocês terem escolhido a Ufes, terem persistido nesse projeto. Parabéns pela conquista”.

A coordenadora da primeira turma, Celeste Ciccarone, destacou a vitória que representa essa formatura para a Universidade. “Os indígenas não só adquirem, como trazem conhecimento. A Universidade tem que celebrar essa vitória; e que seja um começo para a Universidade dentro dessa perspetiva de diversidade, de se abrir para outros saberes. Não houve só um processo formativo dos indígenas, mas da própria Universidade”, afirmou.

Nova turma

A atual coordenadora do Prolind-Ufes, Nicole Soares Pinto, confirmou que a segunda turma do curso deve começar em 2024, com o processo seletivo até o final deste ano. A expectativa é de que sejam abertas 30 vagas. Ela também destacou a importância da formatura desta primeira turma: “A luta dos povos indígenas pela educação diferenciada é antiga. A formatura dessa primeira turma é um marco, pois significa o reconhecimento e o fortalecimento dos direitos dos povos originários”, afirmou.

 

Texto: Sueli de Freitas
Fotos: Ana Oggioni e Sueli de Freitas
Edição: Thereza Marinho